A Anarquia das Vontades e as Vontades da Tirania
Por Anrihardo Zohara
se pudesse ser dito por outro que mal é este, me orgulharia di ser s’um porco. Parte disso aconteceu em sonhos e traumas punheticos. Não pretendi simbolismo, ambiciono escrita cringe e pós-irônica, compulsão criadora, concebo a expressão como encenação. Terminei Ádã; do barro d’uma clareira, fiz o ômu branco, co’s cabelos loiros enroladinhos como o dos malaches. Amaciei com os dedos encardidos, destruí o refiz [com preguiça (no pingulinzinho, esculpido à pressa porque já não aguentara masturbar o meu)]. Aos olhos nervios di Ádã, todas as coisas nos fisgavam confortabilidade, pois, como era recém-nascido, era infinito estava ali — as araucárias, ventos, mares; os pés peludos, perninhas finas, o torso os braços. Andou ‘té a baía, performance ditéria ressaca. Assim que as coisas começaram a ter som ele começou a ouvir o som das coisas. Desespero do grande vazio que era o céu branco aproveitou para dar o primeiro choro, expelindo parte líquida d’el constructo lamosa qual aborto. Chorava sem saber o que era o choro, até então, não haviam sido inventadas as palavras, mas sabia — porque sentia — desse muito-sentir nos olhos, tráfego di energias dentro da cara, muito prazeroso para si.
próxima à beira’água, uma longa mesa di madeira polida, com diversos pratos sobre, comida abundante. A água batia nos pés da mesa, os-escurecendo, voltava pro mar. Ádã seguia à mesa, sei por quê, mas, ao ver a comida, teve fome. Sentou na banqueta, da vista pro oceano. Com o olhar pr’abaixo: uma tigela di quirera banhenta com frango, outra di farofa com ovo salgado, rabanada, ceroulas (das salgadas), salmão grelhado fatiado, pão francês com linguiça carnuda, arroz. Pressentiu. Decotado, devorava, hiperativo, as pilhas, levando tudo pra boca com punhados nas mãos. Xavá vinha daonde a água ainda dava pé. Vendavais dilaceravam suas correntes cacheadas, que vazaveram castanhas pela pele do rosto, dos ombros, das costas, das costelas. Não havendo sequer potência em Xavá, fora serenidade. Diria que tinha uma testa grande, nariz fino, boca di cu, pescoço comprido. Tinha também suculentos seios fartos, meio vesgos, meio despencados, mas daí empinados, com mamilos pequenos roxinhos. A gordura pulante se acumulava nas laterais do abdômen, fazendo divisórias entre os morros. Uma boceta enrugada rosadinha, com uma leve camada di pêlos castanhos claros encaracolados. Coxas molengas que davam em pernas finas vincentas.
sou mera coisa sem importância a outrem — deve ter pensado Xavá diante daquele ômu arectu. E Xavá sonhou. Tanto que só quis sonhar. E Ádã, ao ver Xavá, ao ver os peitos di Xavá, ao ver a xereca di Xavá, não teve tesão algum no pau; agamicamente mole. Continuou comendo as tigelas e pratos e pães, continuou parada a outra criatura, frente à mesa, frente ao mar. Disposta.
“Eu sou sua, Ádã. Fui talhada do mesmo barro. Faça em mim suas Vontades.”
Não falou português, gemeu notas musicais. Cantarola Sol sustenido. Encurralando a mesa ela, pé na mesa pós pé no solo, sentou suas nádegas gordas sobre a madeira abriu pernas pantanais na frente do imundo, depois di deitar. O ômu desviava o olhar di sua vagina. Tamanho incômodo fez ele agarrar uma das pernas da coisa pelo joelho um di seus pulsos, virando ela di lado enquanto esfolava as costas dela na tábula. Xavá esticou as pernas, se levantou foi andando corcunda di volta até a beira’água, na areia se deitou alí, na igual posição que Ádã a tinha colocado na mesa. Ele andou até ela se ajoelhou diante di seu corpo.
a mão esquerda dele, do umbigo, passou-se pelo volume dos peitos dela e pousou neles. Voltou num mamilo. A mão direita foi da virilha até um pouco antes dos joelhos. Ádã mordisca o ventre, perfurando c’os dentes a pele elástica di gosto almiscarado. Nem olhei Xavá nessa hora. Sua língua se enche da banha rançosa, mas, com força dentária, chegou a sentir o gosto do ferro na carne fora-do-ponto. Olhava além, estava tonta, estava gozando ao se ver na boca di Ádã. Ele mastiga uma carne escura di ferro quebradiço, tentando puxar para fora com os dentes, mas vai inundando-se a garganta di sangue espesso amargo. Ela ficava branca ofegava — gozava como se fosse gozar —, mas mantinha seus olhos entediados. Ádã tirou seu rosto da cratera pulsante, engoliu a massa que, com esforço, mastigava, seu pau, pequeno com fimose, latejou.
Sábado, em que se tocaram e sentiram os cheiros dos corpos; depois di se esquentarem com os toques da pele — um escorrendo pelos braços do outro. Se-arrepiavo. Vieram os beijos, junto Domingo — para isso fiz os lábios, erógenos. Quiseram agarrar, disseram a se meter, apertar para se terem, pra se descansar. Pouco a pouco, os braços musculosos di Ádã eram o nariz fino di Xavá, e o pescoço fino dela era a boca dele. As pernas magras finas roçavam, tanto que o calor delas os fez lamber a língua um do outro até que o pau di Ádã estivesse lubrificado. Segunda, se quiseram imóveis; não comeram, bastavam-se, se olhando, acaricinhados. Na Quarta à noite, di céu azul, sentam sobre a rocha da praia, à direita da mesa. Parecia a noite estrelada do Van Gogh.
“Eva.”
“Adão?”
“Eu te amo.”
“O que quer de mim?”
“Se eu te falasse, você não me daria mais.”
Xavá virou o rosto, queria: uma razão externa enquão ser desviar. Ádã nsuportávinquieto em leito sonil, Xavá si oposta ele.
daí, foram se afastando eu fui me aproximando da Xavá. Rastejei ‘té ela na Sexta-feira, vi a sentada no chão encostada na araucária — as coxas arenosas terra molhado ao seu redor.
“Quero entrar aí onde sai água.”
“Como? Eu morrerei!”
“Sim! Morrerá, no mesmo instante renasceria.”
Xavá deitou que a pele das coxas grudasse se soltasse. Olhei por um tempo a penugem enroscada e, antes que me náuseasse com o perfume quente, esfreguei minha língua dentre os lábios murchos. Se ouriçou à gelidez. Golpeei minha cabeça dentro da secura até que me inundasse se abafassem os gemidos da fêmea. Lambi tudo dali, daqueles tecidos pulsadores, ofegante por me forçar demais ao ir me cobrindo por inteiro. As escamas conduziam o líquido para fora e já não mais cortavam a carnificina dela. Puxe’i meu corpo e o empurrava; estava ficando mais aconchegante para nós dois. Puoc puoc, latejando a boceta uva-passa, me apertando enquanto escavador. Acabou. Passou um tempo, eu fiquei enrolado na árvore, vendo Xavá murcha, com as pernas encharcadas ainda abertas, espasmando. Chegou Ádã, se reconciliaram e agora estão transando. Esgueirei-me aos cambitinhos conservadores dele para alcançar entre as nádegas. O anel apertou no meu corpo, entretanto, entrei, estraçalhando tudo. Sujasva-eu de merda, i sufoquei, os pentelhos me atrapalhao. Saí di lá.
partiu cum breu. Este ômu estava sentado coitadinho, perdera a viagem. Lembrou di seu saco, que, assim como o meu, parecia uma peste doente. Arrastou o indicador o médio nele, sentindo duas massinhas por debaixo da pele. Desesperou! Gerava dois fetos saquíferos. Quando se passavam os dias, os meses, eles aumentaram. Agia que, Ádã, carregar os dois, seu saco quase nos joelhos di tão inchado. As crianças mexiam mãozinhas; a cabeçona delas ficava aparecendo. Ihuu: balançavam nas andanças. Era muito peso para portar. Ádã foi lá e pegou uma pedrona da costa amassou um dos nenéns sob o couro. Houve muita dor, hesitou, bravamente avança. O choro do falecido sumindo dentro do testículo arrebentado. Mais alguns dias se passaram Caium descia pelo pinto do ômu, estourando todo músculo, rasgando a fibra esburacando. Neném e seu corpo carbonizado, esfarelava qual carvão. Ádã, sionista, com nojo. Esmorecido, confinou o filho ao peito o trouxe pra Xavá para que reproduzissem entre si.
abocanhei o ômunzinho, esbalheçando o caldo salgado dentr’vácuo, fervendo-lhe d’els sucsos. Cabelinho di malache, chato di fazer, coçava a boca. Mordi a cabeça di Ádã, foi-se rolando ao canal aberto augj gsstrico ruinhdo sjiahsla. Fluídos indo nas comissuras negativa-arquétipas da boca-grã. Mastigava mastigava esta pontuda áspera. Fiz relativa força em cada braço dele. Cambalhotas deu. Cuspi na mão coloquei a forma-pensamento desmembrada no buraquinho da cabeça di meu tirano. Se entalava, me masturbava à cama aberta, o cheiro di pica agridoce emporcalhando a mão o cogumelo peniano. Gozei, foi Ádã escorrendo junto com porra. Tornei à boca todo esperma relaxei, iria ao banheiro me limpar. O súcubus, alimentado por potência criativa, se ocultara em meu gênio — e quão-lucífugo seria; nem por cansaço, solipsista chaoísmo que empurroueis daà falta desinteressadamente gótico.
nunca fui torturado, queimado vivo, rasgado ao meio, afogado. Nunca sofri. Estudantes, trabalhadores, empresários e burocratas — aos meus 18 anos, reservo este final para me imaginar despontando em androginia satânica frente aos seus corpos utilitários. Sortes suas que o desejo cruel que advém da repressão do corpo se acaba nesta escrita identitária, tal como a matéria se autodetermina dentro de seu espaço, dentro do pensamento absorto, irrelevante à compulsão se fosse destituída de crença. Mas que sou um romântico com histórico criminal, dentre o nojo e a posse, o carinho e o corte na minha pele, que falha com o progresso humano por eu ser inferior, não ser devoto do fantasma do Estado, das leis, do gênero, eis aqui o meu narciso que chamo di degenerativismo; pois já fui, afirmo com desprezo, petista, conselhista, stalinista, maoísta, bordiguista, autonomista, autogestionário — embora tenha, ainda, apreço pelo egoísmo stirneano, o anarquismo insurrecionário, o post-punk, o anarco-nihilismo e os luciferanos, eu sou apenas a mágica Anarquia.
“amorte”
Amar: corte de navalha,
escorrendo pela carne,
desce fundo, rasgando o peito,
deleitando-nos com o orgasmo
da não-existência,
salgando para que não apodreça,
e que a gente aceita, porque não tem outro jeito.
amar, mas amar até as veias,
um amor-caveira,
que só compete aos egoístas.
amar, amar… Será que entendi?
Talvez aprendi na maré-cheia,
na larica gnóstica das freiras,
na mão que pega sem pedir,
no sorriso que se abre pra cuspir.
E se nunca amei?
E se esse peso na vida
for só cansaço?
amar é coisa de escravo:
te ver ser arrastada para o porão,
sem [im]pedir
para que me levem.
é o metal roçando a costela;
a dor da vida que se parte,
mas quem sangra sou eu!
Tuas mãos no cabo
confortam as minhas.
— tu vem?
é te olhar
e não ver nada
além do meu riso
se amamentado.
— sou tu, meu bem.
quebra meu crânio com um porrete,
liberte os pensamentos de lá de dentro,
e veja o amor na única forma de pureza existente: a mental.
Mas fura teus olhos primeiro.
Perca a cabeça,
para que veja algo além de si.
— errado! Tu sou eu. Me conte: o que é amar?
é o murmúrio da vila,
a voz do vizinho no muro,
O povo todo reunido pra apontar:
amar foi buscar foder
chorando no caminho.
(e o corpo da cama não queria só foder)
24 de Novembro, 2024